O desejo de morte do pelicano
O Pelicano sentia que a vida se esvaia. Esse era o processo natural. Como uma bomba relógio fadada a explodir desde o dia de sua concepção. Não havia escapatória: não viveria o bastante para que os avanços científicos o tornassem imortal. Por isso respeitava a morte, sua inevitabilidade, em seu tempo, era absoluta. A admiração era profunda: portava-se como um vassalo a mercê da vontade fatal. Poder-se-ia confundir seu respeito velado com o desejo, tantas horas do dia se dedicava ao assunto. Para o pelicano, tratar a morte com naturalidade era indispensável. Sem a morte a vida sequer se faria sentir. Ia mais longe: pensava na casualidade, na iminência, e vislumbrava um ataque fulminante que tanto poderia lhe atacar na próxima esquina como na mais distante, e por isso se agarrava à vida com urgência. O medo, ao contrário de encarcerá-lo, lhe infundia a ousadia. Desejava, sim, a vida, por amar a morte.
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