quarta-feira, fevereiro 16, 2005

e agora gauche

três de janeiro de dois mil e cinco, no sítio, ecoporanga


E agora Gauche? Você que adora ser Drummond mas detesta ser mineiro. E agora? Que já errou o quanto pode pela vida, trocando os pulmões por poesia, lambendo os copos dos botecos, olhando as bundas das meninas, fumando fumo ruim , mijando atrás da delegacia, xingando baixinho as senhoras penduradas na janela, achando inútil se preocupar com o povo, que só quer um salário para beber e foder, bêbados num forró qualquer; você errou, e aí? Agora você quase não dorme, sonhando com o espantalho de terno preto passeando como um fantasma sobre o quarto que você morou. E no sonho o medo de saber que o terno dele era muito bom e brilhava. Agora você quase não respira. Enquanto Deus se disfarça de vento e desaparece, deixando a cidade submersa por um mormaço semelhante à sua preguiça. Agora tudo fede! E alguém suado pede água na sorveteria. E um outro bebe conhaque seco, pensando se acertará ou não o tiro no safado que comeu sua mulher. E a mulher, sem nada saber, ainda continua a querer dar pra outro. Porque o último era muito fofoqueiro. E a polícia só engorda. Os advogados só bebem. E o juiz, um pouquinho também, anda preocupado com o garoto que se enforcou na cadeia e com tiros trocados com os policiais num outro boteco do interior. Mas não duvido também que ele se pergunte: “e agora?”. Você mente todo dia quando diz que está tudo bem, Gauche! E ainda assim vem com essas coisas de amor. Você prefere o câncer a um choro honesto! Você é um fraco! Todos os dias engole os mesmo sorrisos falsos enquanto sua garganta incha de vontade. Se você fosse forte, falaria alto; destrataria as autoridades; diria ao padre que ele está errado! Mas você, que detesta ser mineiro, errou tanto que ninguém te ouve. E agora?