12/06/2007
Um amante em branco. Com afeto, mas sem cantatas para a namorada. O tempo está passando para nós. De repente me peguei espiando pela janela e vi tudo morto do lado de fora. Inclusive ela. Do lado de dentro uma pequena morte em vida, mais uma, como uma flor do cerrado quando chega o inverno. Malditos cactos tão bonitos para serem renegados. Tudo tende a girar no olho do ciclone onde dorme o poeta. Prefere se anestesiar fumando mato, horas contemplando as figuras que se amontoam nos traçados várseos do assoalho, nos respingos de água que cambaleiam contra a luz amarela, enquanto toma banho e ouve Beatles – como fazia antigamente – para espiar toda sujeira que lhe cobre os poros.
O frio queima tudo o que desponta, mas as raízes sobrevivem e logo voltarão a sortir.
Cores.
O poeta colhe a primavera e a enfia na orelha da namorada, enquanto ela caminha pelas avenidas transversais que conduzem à aventura. Ela nua, lambuzada das tintas vermelha, azul, amarela, cinza e preta dos dedos do poeta, com sorriso convulsivo que apreende a realidade com tanta sinceridade e beleza que impregna tudo. O poeta olha para ela satisfeito. Fica excitado, tem vontade de mordê-la, deslizar o lábio inferior pelas regiões do seu corpo colorido. Ela se move furtivamente, o sorriso continua. Os dois são felizes.
Mas na madrugada fantasmagórica o medo abocanha a leveza. Quando acorda o poeta descobre que o corpo já sucumbiu. Nunca havia conseguido antes, ser feliz por tantas horas ininterruptas. É ansioso. As tintas estão secas e quebradiças. O amor pulula por baixo da terra, mas a namorada não pode mais vê-lo.